Terapia do grito
Gritar à vontade durante um jogo de futebol pode ser altamente terapêutico.
Especialmente se seu grito se perde em meio a uma cacofonia animada que contribui para tornar um evento relativamente morno, como uma partida de futebol por vezes medíocre, em um evento que faz o sangue ferver.
Assisti ao jogo entre África do Sul e Nova Zelândia na casa de moradores de Johanesburgo, pessoas vindas de famílias pobres que, graças à democratização e programas de distribuição de renda para negros, em vigor desde 1994, subiram de classe social, para o que no Brasil seria considerado média alta. Dinheiro de ouro e diamantes.
Mas a ascensão social não suavizou a animação dessa gente que atende por apelidos como Gift (presente), Tomb Boy (menino da tumba) e Joy (alegria). E desde o início da partida, os urros, gritos, saltos e socos na mesa ou no ar são constantes.
Outra polêmica que surgiu essa semana tem a ver com o barulho. As 'vuvuzelas' são os cornetões que não param de soar durante todo o jogo. Elas vêm sendo criticadas por serem altamente azucrinantes, mas o fato de as críticas virem, na maioria, de brancos, gerou um debate racial.
Os negros dizem que a vuvuzela é parte integrante da forma deles torcerem. Portanto, se eles se comportam de acordo com a etiqueta local nos jogos de rúgbi e críquete que atendem, que os brancos, considerados por eles verdadeiros turistas em estádios de futebol, respeitem a tradição. Ok, muito bem, me convenceu.
Eu, que na primeira vez que estive em um estádio sul-africano saí com um zumbido constante no ouvido e a cabeça latejando por causa da vuvuzela, já me convenci a levar um analgésico para o estádio e resolver a parada.
Voltando à casa de Gift: o relato que fiz dizendo acreditar que o zagueiro Matthew Booth, branco, estava sendo vaiado pelos torcedores, gerou gargalhadas gerais. "É uma armadilha para enganar quem não conhece", disseram eles.
Com bom-humor, me disseram também que o técnico da seleção da África do Sul, Joel Santana, lhes lembrava o personagem do filme O bom, o mau e o feio, de Sergio Leone. O brasileiro seria o feio, no caso.
Ouvir isso enquanto vejo o rosto de Joel, com expressão de quem acabou de ser acordado no meio da noite pela polícia secreta, contribui para o efeito cômico.
De qualquer forma, a vitória por 2 a 0, se não foi o massacre necessário para lavar a alma da torcida, proporcionou uma sobrevida ao time, que ainda sonha com uma passagem para as semifinais.
dzԳáDzDeixe seu comentário
Ouvir essas cornetas já incomada agente que acompanha pela televisão, imagina pra quem tá no estádio? Haja analgésico, rsrs