O mal necessário
Ainda é cedo para dizer quem serão as grandes estrelas desta Copa do Mundo - os mais filmados, os mais fotografados, os mais adorados, os mais elogiados, os mais polêmicos.
Mas se juntarmos todas essas qualidades em um só indivíduo, eu já tenho o meu palpite: a vuvuzela.
Aqui na África do Sul, não há como escapar dela. No aeroporto, no hotel, nos restaurantes, nos sinais de trânsito, há sempre alguém com uma na boca.
Para fazer os vídeos que você vê aqui na 鶹 Brasil, cada vez que eu monto meu tripé e minha câmera sempre aparece alguém com uma vuvuzela para ser filmado ou simplesmente para fazer barulho no meio de uma entrevista.
E dá-lhe barulho. Jogadores, jornalistas, torcedores e até espectadores que nem estão na África do Sul já começaram a reclamar. Na Grã-Bretanha, a 鶹 recebeu mais de 500 queixas de telespectadores e ouvintes sobre a presença das vuvuzelas durante as transmissões e chegou a considerar a hipótese de filtrar o som do instrumento.
Uma rápida pesquisa no Google aponta para sites e blogs como o Vuvuzelafiltering.com (https://vuvuzelafiltering.com/), onde engenheiros de som ensinam como equalizar uma TV digital para eliminar o zumbido de fundo.
Especulou-se que a Fifa estaria pensando em proibir a entrada das vuvuzelas nos estádios, depois que algumas seleções comentaram sua dificuldade de se comunicar em campo. Mas a entidade desmentiu a notícia.
Nos estádios, quem não traz uma vuvuzela fica sem voz, literal e metaforicamente. Os gritos de torcida, as músicas, os aplausos e as vaias se escondem sob o uníssono "si bemol" da corneta. Será que é por isso que tem havido tantos empates?
No jogo Costa do Marfim x Portugal, que terminou em 0 x 0 em Port Elizabeth, foi visível a (má) diferença que as vuvuzelas fazem. Sendo este o segundo jogo de Portugal a que eu assisto no estádio (o primeiro foi um amistoso contra o Brasil em 2007, em Londres), sei o quanto os portugueses prezam seu "Portugal, olé".
Mas ontem, no Nelson Mandela Bay, não valia a pena nem tentar. A maioria dos torcedores permanceceu sentada, sem vontade de incentivar Cristiano Ronaldo, Deco e seus demais ídolos.
Uma pequena torcida da Costa do Marfim trouxe tambores típicos e organizaram uma bela batucada ritmada, até com um "mestre de bateria". Praticamente passaram despercebidos.
Os sul-africanos, no entanto, defendem ferrenhamente sua tradição. Muitos torcedores locais, simples admiradores do futebol, vão aos estádios para ver o espetáculo e não para torcer para ninguém em especial. Mas com a vuvuzela na mão. Proibir o instrumento a esta altura seria uma afronta à cultura futebolística local, argumentam. E a Fifa não deve querer irritar os anfitriões.
Me pergunto o que ela fará daqui para a frente, uma vez que o instrumento já está nas ruas do mundo, do Rio a Seul. Vai proibir a vuvuzela nos jogos nacionais, nas Ligas de Campeões e Libertadores da vida, nos amistosos internacionais, na Copa de 2014? Está aí uma dor de cabeça que, para a entidade que manda no futebol, não vai passar com uma simples aspirina.